sexta-feira, 30 de setembro de 2016

A perda da fé

Se trata, antes de tudo, da perda do encanto e da queda na indiferença.



A TEOLOGIA

Talvez ninguém tenha tido a arrogância acadêmica antes mesmo da própria Igreja, que inclusive inventou a universidade. A crítica e construção meticulosa do conhecimento já era procedimento corrente na Idade Média, sendo que à época tinha-se noção de que os assuntos são hierárquicos entre si, ou seja, clero > nobreza > povo estão para teologia/moral > política/guerra > economia. E obviamente era dado maior importância à teologia, pois era uma época em que os homens conseguiam perceber que toda a sociedade está ancorada numa metafísica.

E, fazendo uma analogia de trás pra frente, pode se dizer que o conhecimento era tão determinístico como quando Lord Kelvin insinuou que as ciências tinham encerrado. Tudo isso baseado na falsa visão de que o observador e o objeto podem estar separados sem que um influencie o outro, como se eu pudesse ter um panorama alto e dominasse com meus superpoderes todo aquele objeto.

Mas em se tratando de Deus, isso apresenta um risco tremendo. Se em algum momento passar na mente do teólogo que Deus é um objeto finito que sua ciência pode apalpar e medir, então ele se perdeu no seu orgulho e nisso ele perdeu toda a sua inteligência. E isso vale para a revelação como um todo, a Bíblia, pois se só podemos contemplar a Deus pela hierarquia e diferenciação entre os serem inferiores e superiores, tendentes a Deus (São Tomás de Aquino). Resumindo, as explicações materialistas e psicologizantes são falsas. Explico.

Está seção do texto é motivada por uma conversa que tive com Frei (dominicano) Almy. Certa vez uma mulher veio a ele e disse: "padre, eu gosto tanto dos assuntos religiosos, eu queria estudar teologia, para aumentar a minha fé". O Frei, talvez remetendo ao tempo de seminário, em que acompanhou a evolução de seus amigos, recomendou que não fosse para a teologia, mas para os místicos, pois a teologia a faria perder a fé.

Na minha opinião, o pior de explicações psicologizantes ou materialistas não é o fato patente de que perderam em mistério e devoção — como ao discutirem a virgindade de Maria —, mas é a postura de quem lê. A postura de certos teólogos é a idêntica a de um técnico, talvez como um torneiro mecânico, que ajusta com tédio os parâmetros da máquina… como se teologia fosse mais um assunto pra mesa de bar.

Mas o que deve proceder NECESSARIAMENTE o estudo da teologia é justamente a contemplação mística e por isso mesmo os monges são os melhores teólogos, como o próprio São Tomás de Aquino. A contemplação, assim como está no livro "Plínio Corrêa de Oliveira: profeta do reino de Maria" não é nada mais que a degustação do belo. Por exemplo, ao se meditarem os mistérios do Terço, cada vez mais se acrescenta beleza em ver como o mundo, significado por esses mistérios, é belo. Contemplar é demorar-se diante do belo, alimentando a alma. Só assim se consegue a humildade suficiente para manusear a matéria da teologia. Quem mais se humilha, mais se aproxima de Deus e está mais apto a compreender sua palavra, que é Nosso Senhor Jesus Cristo.

Não é possível se aproximar dos mistérios de Deus sem antes rezar. Não é uma ciência como qualquer outra, da qual se aproxima com indiferença. Aliás, pra compreender uma determinada ciência além dos seus limites, no concerto das ciências, também é necessário rezar, pois a unidade está na fé.

Nesse ponto, a fé está muito mais por uma atmosfera do que por um conhecimento formal. Uma missa, uma festa do calendário litúrgico........

O CIENTIFICISMO

Por outro lado, é patente a soberba de qualquer professor universitário, que faz da arte que domina o seu deus é se coloca como sacerdote. O conhecimento é muito perigoso para a humildade, pois dá a sensação de poder. Por isso a árvore do conhecimento do bem e do mal tem muito significado pra ser meditado.

A PERDA DO SAGRADO NO COTIDIANO

Imaginem o caso da execução de uma peça sacra de coral barroco apenas pelo critério da qualidade da técnica musical, mas desvinculada da Fé correspondente ao louvor. Imaginem avaliar a arquitetura de uma Igreja sem adentrar na simbologia profunda de seus adereços. O mesmo vale para as liturgias tradicionais, perto das quais a atual é minimalista.

Todas as vezes que se desvincula a fé da arte e da cultura, perde-se algo. Uma música sacra não é um todo em si, mas é justamente o entorno da liturgia. Tem gente que acha que basta combinar aleatoriamente as músicas e as liturgias, como se uma pudesse ser feita independente da outra. A música sem a fé perdeu o seu coração.

A PERDA DOS DONS DE DEUS NO MUNDO

Deus deu aos seus apóstolos, ou seja, àqueles que passarão o bastão do testemunho da verdade da revelação completa até o fim dos tempos, um real poder de transmitir dons diretos de Deus. A melhor demonstração disso são os 7 sacramentos e o poder de expulsar os demônios (exorcismo).

Não vou me alongar muito aqui, mas entenda-se para os demais sacramentos de forma analógica o que eu direi para a eucaristia. A festa de Corpus Christi nos relembra — pasmem! alguns católicos se esquecem disso — que Deus está vivo na terra diante de nós. Não se trata de uma imagem que faz referência aos santos, à Nossa Senhora ou ao Sagrado Coração de Jesus. É Ele lá em pessoa, por isso nós ajoelharmos para adorá-lo.

A revolução protestante, assim como as tendências atéias e agnósticas, sob o disfarce de laicismo, leva a perda da Fé pela descrença progressiva de manifestações diretas de Deus na realidade. A comunicação de Deus com o mundo, ao invés de ser um canal aberto e inequívoco, vai se tornando turva e fugidia, a ponto de tudo parecer só um ato de procedência humana que simula ou imita a Deus.

A fé nos possibilita dons diretos de Deus, mesmo que através de mãos pequenas e pecadoras dos padres. Faz parte do exercício da nossa humildade recebermos deles, que às vezes podem parecer ignorantes, broncos ou até sem fé, para que o orgulho não se esconda em nós e achemos que somos dignos de Deus.

O ORGULHO E A SENSUALIDADE

O próprio pecado original é a desobediência, ou seja, a revolta do homem contra a ordem objetiva do mundo — daí os relativismos, subjetivismo e a célebre pergunta "quid est veritas?" — e isso é a fonte de todos dos desequilíbrio, males e injustiças sociais.

Os pecados se expressam de várias formas.

Observando a alma humana, vemos 7 pecados originados do egoísmo ou orgulho, que é o meta pecado atrás de todos: a vaidade, a inveja, a ira, a avareza, a gula, a luxúria e a preguiça.

Observando a ordem do mundo criada por Deus, vemos a obediência aos 10 mandamentos (Ex 20, 2-17), que depois evoluem para a perfeição das bem aventuranças (Mat 5, 3-12). As mesquinharias do egoísmo de nossa alma geram desordens no mundo, ofendendo a Deus e ao próximo.

Uma visão ao mesmo tempo da ordem da alma e do mundo foi legada pelo Dr Plínio Corrêa de Oliveira ao demonstrar o espírito por detrás de toda revolução ou rebeldia: o orgulho que não suporta nada acima e a sensualidade que não suporta limites. Esquematicamente temos sempre esses dois lados:

  • Orgulho e Sensualidade
  • Igualitarismo e Liberalismo
  • Socialismo e Capitalismo
Mas:
  • Hierarquia e Disciplina (Pureza)


A perda da Fé do ponto de vista do pecado pode ser vista por outro lado da palavra fé. O sentido ordinário é a mera crença de que os princípios de Deus são verdade. Mas somente é fiel a Deus aquele que guarda seis mandamentos, ou seja, que ficam felizes de impregnar a própria vida com eles.

Ora, o pecado é justamente o oposto disso, o oposto da Fé, da verdadeira caridade. Quanto mais pecamos e nos afirmamos em detrimento de Deus, mais o ruído na nossa vida vai encobrir as suaves melodias da contemplação de Deus, a verdadeira felicidade. O pecado vai nos deixando insensíveis, indiferentes, não compassivos, cínicos, pessimostas, maliciosos e incapazes de ver o belo.

E uma ressalva: não há um de nós que não peque. Mas isso não justifica o cinismo de desistirmos de combater a maldade em nós e no mundo, pois é a Deus que devemos pedir isso é não confiarmos em nossa capacidade. Acharmos que somos autônomos, não dependemos de Deus e do próximo, é a receita do fracasso.

FÉ, ESPERANÇA E CARIDADE

É necessário termos fé, vivermos a lei de Deus, aplicarmos em nossa vida e no mundo. Mas isso não é mérito nosso, por isso é necessário esperarmos que Deus complete a nossa fé de grão de mostarda, pois são só os méritos dEle que transformarão a nós e ao mundo. E a transformação é todos vivermos a caridade perfeita, a salvação e o paraíso, cujo farol é Nosso Senhor Jesus Cristo.

A fé é aquela chama valiosa. Devemos carregá-la como a mais valiosa de nossas pérolas. Mas lembrando que devemos ter cuidado, por que é uma chama pequenina, delicada, tímida, e o mundo anda a soprar vendavais. E se Deus a faz crescer, seremos as lâmpadas que não se escondem, mas brilham no mundo com palavras amáveis, exemplos concretos, repreensões necessárias e guerra contra as forças inconciliáveis do inferno.

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