quarta-feira, 1 de julho de 2015

Ciência: muito a transcende

A ciência é um modelo, logo deve aderir à realidade. No entanto não é a própria realidade, pois por meio de recortes o intelecto separa aquilo que quer ver da realidade e cria pra si uma imagem, podendo ser mais ou menos abstrata (ou seja, sendo mais universal na mesma medida que releva os fatos acidentais). A conclusão que chego é que toda ciência, seja básica ou aplicada, tem função utilitária.


Aqui há uma explicação da diferença entre ciência (na acepção moderna, de método científico) e técnica:
http://www.olavodecarvalho.org/avisos/intro_metodo_filosofico.html

O que tem função meramente utilitária é a arte/técnica. No entanto a ciência SÓ se justifica por seus efeitos indiretos da obtenção do conhecimento. O produto da ciência é o conhecimento. Ora, ciência deveria ser um termo muito mais amplo - incluindo por exemplo a revelação divina - do que os meros modelos de aspectos e recortes repetíveis da realidade. "Scio" é saber em latim, então bastaria que se soubesse para se ter ciência (scientia). Mas o saber de hoje carece de uma falsa garantia, um método burocrático aprovado por uma convenção social da comunidade científica.

Saber contar uma história, ter uma imagem - mesmo que sem palavras para contá-la aos outros - da contemplação da natureza, saber de macetes para resolução de problemas, conhecer a fundo os processos da natureza ao lidar com ela... várias dessas coisas são ciência, pois sabe-se de algo.

O intelecto humano é a própria ciência. Contemplando a própria limitação do intelecto humano vê-se a limitação da ciência. O intelecto humano nunca conseguirá compreender (palavra que, do latim, significa prender dentro de si) a totalidade, assim como a soma de todos os recortes da ciência nunca darão conta da realidade: ao juntarem-se, as linguagens dos diversos ramos da ciência não são compatíveis e suas diferenças brotam do próprio recorte em si, que limita a totalidade.Outros fatos ainda mostram a total dependência da ciência. Em primeiro lugar depende da fé em princípios inquestionáveis da lógica e da matemática. Suas proposições são proposições de fé, como a da física relativista, que faz afirmação sobre a velocidade da luz ser constante no vácuo. Nunca um fato poderá ser experimentado até o infinito: sempre poderá que ocorra diferentemente no futuro.

Ainda surge aquela inquietação de Pilatos ao dizer "o que é a verdade?" (João 18, 38). E o próprio Cristo se diz a verdade (João 14, 6). Qual é a substância da verdade? Seria uma pessoa de carne e osso? Que sentido tem isso?

A verdade é uma frase? É um enunciado? É uma imagem, uma equação? Onde podemos apalpá-la? Só há uma coisa a dizer sobre a verdade: ela é a própria realidade ao acontecer. Por isso mesmo não podemos compreender a realidade, porque ela é muito mais que nós. Por isso que a verdade só pode ser Deus, que é tudo.

E onde entra a ciência como critério universal? Em nenhum lugar. Pois ao depositar toda a confiança na ciência está-se a praticar a idolatria, que consiste em criar deuses (por mãos humanas) nos quais os homens põe a sua confiança. Uns põe sua confiança no dinheiro, outros nos prazeres do mundo. A ciência não é mais do que um falso deus criado por mãos humanas. Ao crer e ofertar sua vida a um falso deus, esse falso deus retribui com sua característica: o deus do dinheiro dá dinheiro, o da ciência dá ciência, o dos prazeres dá prazeres. Ora, mas como esses deuses são tão poderosos? Ora o fato de serem falsos deuses não se dá pelo fato de que não têm poderes, mas se dá pelo fato que todas essas coisas não são riquezas, mas vaidade (que para nada servem) que engana e desvia o homem das coisas que convêm.Ora, mas então parece que a ciência não serve pra nada. Pelo contrário, a própria pergunta "pra que serve?" já implica numa resposta utilitária. E é o caso da ciência, que, como tudo, serve para alguma coisa na rede de finalidades que o mundo tem. O mundo tem uma origem (uma causa) e um fim (uma meta, objetivo) e no trajeto o homem deve trabalhar com suas ferramentas, cada uma com sua utilidade. Como os modelos nunca serão a realidade, nem nunca preverão a riqueza de detalhes da realidade (o que ela mais faz é eliminar os detalhes), então pode-se dizer que a ciência tem pouco a dizer sobre a verdade. Logo, só sobra sua utilidade.Por isso mesmo que a postura científica tem se tornado gradativamente mais humilde. O observador, ao invés de crer poder estar acima da realidade, já reconhece que ele faz parte da realidade e interage com ela no momento da observação. As biografias têm se tornado fonte de conhecimento na medida que mostra a motivação das pesquisas em certas áreas - cada vida humana pode ser vista como uma eterna pesquisa de mil nuances. Isso até valoriza a história como fonte de ciência: mesmo o diversificado, incerto, subjetivo, parcial é uma informação relevante.

Termino dizendo que a ciência é mais um dos vários trabalhos dignos do homem. O homem tem que sobreviver de seu suor e o bem comum deriva de um trabalho bem feito, de riquezas concretas criadas. E se for para ajuntar coisas valiosas, que não seja a ciência, mas a fé, a esperança e a caridade.


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Postado no facebook em 02/12/2012

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