domingo, 28 de novembro de 2010

ex fructibus eorum cognoscetis eos (Mt 7, 20)

Como primeira postagem, começarei refletindo sobre as eleições que se passaram no Brasil. Na verdade é um fato que apenas motiva a discussão. Essas eleições são motivo de várias reflexões, é possível puxar um tema e deslanchar. Pois esse assunto vai desde o fato de que há alguns que reduzem toda a vida humana à política. Há as questões sobre a hipocrisia e com ela me lembro da citação que meu professor fez que "a hipocrisia é o tributo que o vício paga à virtude". Eu poderia discutir a formação dos valores numa pessoa, que assimila diversas experiências na vida até chegar ao ponto atual, em que vemos que a formação de seus valores é conduzida pelas experiências e direcionada pela vontade (às vezes forte, às vezes fraca) do sujeito. Outra opção seria falar sobre os valores que devem ser concretizados pela via política.

Entre todos, gostaria de falar da manifestação dos valores, do produto das ações. Pelos seus frutos os conhecereis. Não quero tratar da hipocrisia, dos valores humanos, nem das verdades do mundo. Quero apenas falar das conseqüências.


Nós vivemos na sociedade que impõe certos preceitos indiscutíveis, que balizariam as relações sociais pautando-se na pluralidade dos valores. Nesse contexto temos a abominação da censura e do preconceito, ao passo que liberdade e tolerância viram palavras de ordem. Um grupo de palavras assume o que seria o mal e outro o que seria o bem. E isso sem qualquer reflexão sobre o fato de que a malícia se traveste de virtude e que a retidão redime aquilo que se propôs ao mal. A realidade é mais complexa do que dois pólos facilmente identificáveis. E não interessa aqui saber quais são os valores universais (isso caso haja algum), pois isso vale para os valores que cada um elege para si, quando se vai medir a realidade com seu metro.

A hierarquia dos valores de cada um leva cada pessoa a tomar suas próprias decisões. O valor entendido nesse sentido amplo seria algo subjacente à definição dos valores econômicos, por exemplo. Aquilo que eu quero concretizado me serve de parâmetro para minhas ações futuras e para as ações passadas minhas e dos outros. E não adianta nos eximirmos de julgar. Pois cada afirmação é um julgamento. O juízo é a faculdade da mente, pois ele decide sobre a verdade. E quais são os critérios dignos de serem usados para se julgar?

Se vemos uma ocorrência de algo que fere nossos valores e ela quase sempre está acompanhada de um fenômeno, fazemos mal em tentarmos nos prevenir quando o fenômeno nos aparece? Pois a sociedade nos repreende, e já tem um rótulo pronto para isso: preconceito. Se um físico nos adianta que a trajetória do corpo seguirá a função f, de acordo com os parâmetros x, y e z, devemos acusá-lo de preconceito? Ora, a ciência é um modelo, ela não fala a verdade sobre a realidade, mas ela a descreve de acordo com a utilidade. Se um físico pode tentar prever e cometer um erro na previsão, por que nós também não podemos?

E o princípio que se vê em Mateus 7, 20 é que os produtos das ações indicam a que elas se prestam. Eu escolhi esse princípio para reger os meus juízos da realidade. Muitos podem dizer que não, que não é válido. E é o que de fato vejo nos dias como hoje.

Se aquele velhinho olhava para a pessoa que se tatuava e previa algo de ruim nos costumes dele, porque o desprezo e taxá-lo logo de preconceituoso? Ou se ele se depara um um cara de dreadlock, fazendo apologia da liberação da maconha, por que não se pode concluir algo a mais? Em português há o termo cosmovisão, que é o equivalente do que há em alemão (e lá ele foi bastante desenvolvido) que é Weltanschauung. A cosmovisão seria a reunião do fim para o mundo numa única visão, o que é o caso das religiões, por exemplo. Na minha opinião, eu advogo que cada pessoa forma sua cosmovisão durante a sua vida, que não é nada mais que os valores (numa tentativa de reduzir as contradições que se vê no mundo) que apresentam um certo padrão em julgar o mundo e em fazer escolhas.

E será tanta coincidência algumas coisas andarem mais juntas que outras? A nossa sociedade quer separar duas esferas para a vida:
  • A esfera das nossas relações mediadas pelas formalidades (normalmente impostas pelas normas estatais), em que o simples cumprimento dos requisitos seria a grande ação cívica.
  • A esfera pessoal, em que cada pessoa tem o legítimo direito de fazer as coisas mais macabras ou estranhas, desde que isso não afete as formalidades da outra esfera. Aliás, a outra esfera não se intromete aqui justamente para ser plural e garantir o gozo mais arbitrário que se queira.

Bem separadas essas esferas, alguns nos forçam a acreditar que devemos julgar a realidade com a devida separação. Mas se esquecem que não há julgamento possível:  não poderemos falar nada sobre as decisões pessoais (já que isso é uma ofensa à pluralidade) e, ao mesmo tempo, o julgamento das formalidades estatais é a priori, já que o valor já está impresso na lei. Ai de quem quiser misturar essas duas esferas!

Nós vemos essa questão no momento da decisão de como educar os filhos: se privamos eles de alguma coisa estamos praticando censura (a palavra maldita). Um exemplo é quando se protegem as crianças da pornografia. Aqui chego ao que motivou o texto, na questão política. E, obviamente, não parecerei imparcial. Nessas eleições de 2010 tivemos hipocrisia? Sim. Tivemos mentira? Sim. De quais lado? De todos. Dentro das formalidades do estado, não se proíbe mentir, não se proíbe trapacear: enfim, as eleições são decididas pelo discurso melhor preparado (aí entra o marketing). E aí entra uma outra discussão (que não será abordada aqui) sobre o sistema jurídico atual, que funciona mecanicamente com regras previas rígidas, ao passo que antes julgava-se pela moral e com regras menos explícitas (mas muitas vezes pecando-se pela arbitrariedade). Mas essa é mais uma discussão que decorre da nossa sociedade mecanicista, burocrática. Mintzberg que o confirme.

Muitas coisas foram escondidas. Uma delas é o passado dos partidos. Obviamente que estou falando de Dilma, embora Serra estivesse do mesmo lado, entretanto de forma mais branda. O próprio passado do PT (e sua cúpula) é uma coisa que não se toca muito no assunto. O próprio caso de Celso Daniel e as diversas mortes ao redor do caso não espantou ninguém. Quando estava junta dos seus, Dilma se orgulhava de estar do lado que pegou em armas contra a ditadura, mas na hora do horário eleitoral o PT não enfocava essa parte.

Outra versão da mesma frase bíblica é que a boca fala do que abunda no coração (Mt 12, 34). A fala é o fruto do desejo do coração. E o que deseja o PT? Ou mesmo o FHC do PSDB (o que falou para esquecer o que havia esquecido)? Na época deles pipocavam regimes baseados no marxismo, espalhando o genocídio contra opinião e classes pelo mundo. É para essa "democracia" que lutaram os terroristas no Brasil. Aí alguém me dirá: "mas as pessoas mudam, temos que dar o nosso voto de confiança, todos merecem uma segunda chance, afinal o Brasil é o país da tolerância". Isso é verdade, mas tem uma precondição.

A evolução das nossas idéias passa junto da nossa biografia. Daí a utilidade em se estudar história, já que é a biografia do mundo. Qual é o trajeto das idéias desse pessoal de esquerda? Eles mudaram? Não há mais o ranço, a práxis assassina contra a dissidência ideológica? Se sim, onde está o discurso que renega a opinião passada, do pecador que se arrepende de seus pecados? E onde estão os indícios na biografia de tal mudança? Ora, quem diz que essas filosofias estão mortas e superadas, que tal dar uma passadinha nos departamentos de humanas da USP, ou notar qual é o estilo de discurso das greves (anuais?). Lá se pode ver jornais como "Aliança da Juventude Revolucionária" (será uma revolução de idéias?) e que as chapas acadêmicas são dominadas por partidos como PCO e PSTU - aqueles que o brasileiro médio vai falar que são uns doidos - numa política acadêmica que supera a sujeira da nossa política nacional (basta ver como ocorre uma votação numa assembléia na FFLCH).

Os sinais estão todos aí. Mas parece que está proibido fazer as relações. Discurso rançoso, as mesmas incitações para conflitos entre classes (negros x brancos; pobre x rico; homossexual x homofóbico etc.), greves sem fim, discurso em tom agressivo (pra ganhar no grito)... Há muitos exemplos, mas só nos permitem analisá-los como fatos esparsos e independentes.


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